31 de março de 2022. Orlando, Flórida. Me enrolei no balcão da imigração americana.
Todo mundo que já foi para os Estados Unidos um dia, passou por isso. O frio na barriga na hora de conversar com o agente de imigração e ver se ele vai te deixar entrar no país.
Para quem não sabe, o agente de imigração pode impedir a sua entrada nos Estados Unidos mesmo se você estiver com passaporte e visto americano em dia, hotel reservado, passagem de volta e dinheiro no bolso. Ele simplesmente pode dizer: não.
Apesar de já ter ido para os Estados Unidos inúmeras vezes, dessa vez eu me enrolei porque na minha velha mania de ser honesto, fui falar que estava chegando por Orlando para visitar uns amigos, mas que depois iria para a Califórnia para a Universidade de Stanford.
Pronto, foi o suficiente para ele me questionar: “Então o seu visto deveria ser de estudante, não é mesmo?”
O mais interessante aconteceu quando eu fui explicar que eu estava indo para um evento, o Codex Future Law, e não para um curso de graduação. Quando disse a ele que eu era um Legal Designer, tenho para mim que ele desconfiou que eu estivesse inventando essa expressão e disse: “O que faz um Legal Designer?”
Quando eu disse que nós realizamos projetos de inovação no Direito ele riu e disse com tom de deboche: “Bem, não tenho visto muitas mudanças no direito por aí...”
Depois que eu dei o exemplo do Design de Informação, também conhecido como Visual Law, ele entendeu e até comentou “Que legal. Você entende de direito de imigração? Seria excelente ter uma cartilha sobre isso por aqui!”
Na dúvida, preferi responder que não sabia nada de direito de imigração. Pelo susto que eu já tinha passado até aquele momento, achei que era melhor não mostrar que sei sobre esse tema.
O direito ficou para trás
Eu contei esse episódio porque ele é um dos que já aconteceram na minha vida e que mostraram que o Direito não acompanhou as mudanças sociais.
Nas últimas décadas, a tecnologia se tornou acessível e hoje todas as pessoas têm um celular, um tablet ou um computador e acessam a internet, consomem informação, trabalham, fazem negócios, namoram, estudam. Tudo na frente de uma tela.
E esse acesso fácil à informação causou um efeito colateral importante. As pessoas não têm mais a paciência que tinham antes. Se, no passado, a pessoa tinha que esperar o dia inteiro para ver as notícias no Jornal Nacional, hoje se um amigo conta que o avião da Marília Mendonça caiu, a pessoa chega nessa notícia em menos de 15 segundos.
E ao chegar no conteúdo, ela quer que o ponto principal seja informado rápido. Ela não quer ler 15 parágrafos para saber quanto vai custar os ingressos do próximo show do Coldplay. Ela não quer assistir até o final de um vídeo de 15 minutos para saber a causa da separação da dupla sertaneja Simone e Simaria.
A hierarquia da informação no Direito
Essas mesmas pessoas são as pessoas que terão contato com seu conteúdo jurídico. Seja ele um contrato, uma peça processual, uma política de privacidade, os termos de uso de um aplicativo ou o relatório para um cliente.
E quando eu falo de hierarquia da informação, me refiro à ideia de que toda informação tem uma ordem, uma sequência lógica para ser apresentada.
E acredito que agora você já entendeu que, para o leitor, a informação mais importante deve aparecer primeiro, não é mesmo?
Essa noção é muito conhecida na área de comunicação, em especial no jornalismo, que utiliza um método chamado de pirâmide invertida.
No jornalismo tem um jargão chamado “lead jornalístico” que é o primeiro bloco de texto de uma reportagem e responde às questões básicas, o que aconteceu, quando, como, quem está envolvido e o que aconteceu.
Essa maneira de escrever é uma maneira que quer dizer: “Vou direto ao ponto”. Vou começar pelo que é mais importante!
A pirâmide invertida começa pela informação essencial.
Depois, a informação que é importante.
Então, a informação complementar.
E, por fim, a informação auxiliar.
A ideia de começar o texto com a informação essencial para o leitor tem como fundamento a busca pela objetividade e leva em consideração diversos fatores da sociedade atual, como a dificuldade de ler textos complexos, a pressa de ler textos longos e os altos níveis de dispersão na leitura, especialmente com os hábitos da vida digital, onde as pessoas têm muitos estímulos simultâneos e a atenção é muito picotada.
Com isso, a tendência é a pessoa começar a ler e se não encontrar a informação, ela passa para a próxima ou desiste de ler o conteúdo.
E perceba como isso é importante na área jurídica.
A questão do tempo, do nível de atenção e do nível de dispersão é essencial quando se está escrevendo um tipo de conteúdo que tem como objetivo informar uma pessoa que terá que realizar uma tarefa, como são os contratos, por exemplo.
Então, ao escrever um documento jurídico, você tem que ir direto ao ponto, fornecer para o leitor, o que ele mais deseja encontrar naquele documento.
E a pirâmide invertida ajuda a ter essa objetividade ao transmitir as informações.
Quando você começar a observar os textos que nos rodeiam, perceberá que a maioria deles despreza essa estrutura da hierarquia da pirâmide invertida.
É muito comum, por exemplo, que os textos se iniciem dando uma justificativa, tal como “de acordo com a lei..., segundo o que foi decidido.... conforme a resolução xyz ”. E só depois de um outro momento é informado o porquê que aquela comunicação está sendo feita para você.
É um tempo precioso que se perde.
E temos pouco tempo disponível para captar uma informação.
Jogamos fora a atenção da pessoa.
É muito comum também uma certa desordem hierárquica, ou seja, o texto fala de um assunto, depois muda, e então volta a falar do assunto anterior.
Eu já cansei de arrumar contratos com esse tipo de erro. Na verdade, é mais raro encontrar um contrato que não tenha esse tipo de desordem do que encontrar um diamante.
É importante lembrar que, antes de decupar um texto, a questão da hierarquia é algo que você tem que sempre pensar enquanto estiver escrevendo um texto.
Tem que fazer um planejamento antes.
Antes de escrever uma política de privacidade, pense em qual informação dessa política é mais essencial para o leitor. Não o que você acha que é mais importante.
Antes de escrever uma contestação, pense em qual informação dessa defesa é mais essencial para o juiz entender a sua tese.
É comum ficar preso ao processo de origem daquele conteúdo e acaba não se colocando no lugar da outra pessoa, que é a empatia, e entender como é melhor que ela receba aquelas informações.
Muitos profissionais do Direito cometem o erro de acreditar que seus documentos são como uma peça de literatura, ou seja, um romance, cujo auge e final dramático deve ser deixado para o final, criando uma curiosidade no leitor.
Não! O contratante não tem tempo para ler um contrato romance. O Juiz não tem tempo para ler uma peça romance.
Os documentos jurídicos têm outra finalidade. Pense nela quando escrever. O que você deseja que o leitor do seu documento faça, assim que terminar de lê-lo?
O que eu quero que você faça.
Ao final da leitura desse artigo, eu espero ter te mostrado a importância do Visual Law para todo e qualquer profissional do Direito.
Quero que você perceba que o profissional do direito é um portador de informações em uma era da informação! E que devemos nos adequar a esse contexto social para ter sucesso. Escrever com eficiência para as pessoas do nosso tempo é essencial.
O seu próximo passo?
Se inscrever para a Imersão Visual Law 5.0 que eu ministrarei na semana que vem. A sua chance de entender essa e outras técnicas e ferramentas para elaborar documentos jurídicos mais eficientes.
Clique no link e lá você encontrará todos os detalhes.
Mauro Roberto Martins Junior
Comments